Eliane Lima apontou que os seres humanos são condicionados por sua cultura, a qual é marcada por um paradigma dominante que confere autenticidade a um conhecimento, sendo este concebido como modelo. Segundo a pesquisadora, o padrão cultural hegemônico é naturalizado, e vivemos sob o paradigma antropocêntrico, especista, em que é normal comer carne (status quo) e que todos o fazem (pensamento hegemônico)”.
Por outro lado, as mudanças culturais levam às mudanças de paradigma e, por consequência, surgem leis que deem conta da mudança. Os paradigmas culturais representam a maioria, sempre havendo pensamentos concorrentes, lembrou a psicóloga. Vivemos uma crise de paradigmas. Ela retomou a palavra crise, de origem grega e derivada de “vento”, cujo significado aponta para um momento de alternância e impossibilidade de ser igual ao que se era antes.
Apesar das mudanças que uma crise impõe, Eliane lembrou que poucas foram as mudanças culturais que foram revoluções, porque uma revolução implica na ruptura do sistema político, econômico e social com a consequente formação de um novo sistema. Ela citou como exemplos a revolução do fogo, que marcou o início do sedentarismo e da dominação da terra, e a Copernicana, em que a Terra foi entendida como não sendo o centro do universo.
Eliane acompanha o vegetarianismo há alguns anos e aponta que estamos vivendo uma grande revolução cultural, a revolução vegetariana. Por meio da rede social Cadastro-Veg, a psicóloga e socióloga percebe o crescimento exponencial do número de pessoas que retiram o consumo de carne e derivados de suas vidas. “Está havendo uma mudança no papel da espécie humana em relação a todas as demais, o despertar para a percepção de que não somos o centro, mas parte da vida”.
Evidências da revolução
Eliane Lima apontou que são muitas as evidências desta revolução. Em nível mundial, o crescimento da oferta e demanda de produtos substituindo a carne, sapatos e acessórios veganos, filmes que discutem a questão, além da criação do Partido dos Animais, fundado em 2002, na Holanda e que tem representantes na Comunidade Europeia, e a proibição das touradas na Catalunha e Ilhas Canárias. No Brasil, a proibição de animais em circos de diversos estados brasileiros (São Paulo, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Mato Grosso do Sul); a proliferação de feiras orgânicas e restaurantes especializados e a informação em rótulos sobre a não realização de testes em animais ou o uso de derivados destes. Eliane comemora: “o Brasil é o segundo país em que mais cresce o vegetarianismo”, ficando apenas atrás do Canadá.
“O que é vivo busca viver e por isso deve ser respeitado, este é seu valor inerente”
Rafael Mendonça Foto: Danielle Sibonis/EcoAgência |
A ética é a preocupação com o outro. Vivemos sob a tradição da ética antropocêntrica, focada no humano que é tido como o topo da hierarquia, afirmou Rafael, que citou o filósofo Immanuel Kant, um dos fundadores deste pensamento. Kant atribuiu ao homem valor inerente, conferindo-lhe o direito à dignidade. “O critério da ética antropocêntrica é o raciocínio, sendo esta uma característica limitada a nossa espécie, por isso ela não é uma ética universal”, destacou Rafael.
A senciência surge como outra categorização ética, definindo a sensibilidade e a consciência como fatores decisivos. Indo além na oposição à supremacia do homem está a ética biocêntrica, em que toda vida passa a ser um valor moral. “O que é vivo busca viver e por isso deve ser respeitado, este é seu valor inerente”, explicou o pesquisador. Esta visão desaprisiona os animais não humanos e todas as outras formas de vida de seu valor instrumental.
A valorização de nossa espécie e sua supremacia, como acontece no antropocentrismo, é uma espécie de fascismo, em que uma espécie se sobrepõe às outras, escravizando-as e matando-as para chegar aos seus fins, acusou Rafael, que completou: “cada ser é único e singular, toda vida deveria ser considerada moralmente, o que é um dedo no narcisismo humano”.
Dependemos do todo e de cada espécie, lembrou o pesquisador, e por isso temos que, além de entender o meio, buscar compreender o que é necessário fazer para manter o equilíbrio do planeta. Isso é a Ecologia Profunda, uma interação mais junta com o meio e a vida. Para ele, devemos reinventar a forma como vemos o mundo, equilibrar nossas relações com os outros seres, que assim como nós, são membros da comunidade Terra.
Fonte: EcoAgência - Via: ANDA
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